segunda-feira, 28 de julho de 2014

O ÓDIO, por Tádzio Nanan

O ódio respira pelos olhos do odiento, que ardem em chamas e crivam seu objeto com raios fatais de pura maldade. O ódio se nutre da imagem do objeto odiado e assim se robustece, se solidifica, tornando-se muralha intransponível para o afloramento dos bons sentimentos. Quanto mais odiamos menos amor temos a oferecer aos outros. Ódio e amor são mutuamente excludentes. O ódio é exclusivista. É ele e mais nada. O ódio cresce na garganta, sobe para a língua, explode pela boca, e se torna verbo, palavras malévolas, maledicentes, cantos noctíferos, que espalham sombras e noites. O ódio é força da natureza quando assume os braços, as mãos, do odiento, e promove a destruição que tanto almeja, à força, com golpes implacáveis, irreversíveis.
Quanto mais fracos somos mais forte ele se configura, e se somos uma nulidade moral ele se torna infinito, torna-se nossa segunda pele, ou mais que isso, nosso lar, passamos a morar nele, escondemo-nos covardemente debaixo de sua asa negra, ele nos protege, acarinha, e escancara as portas para nosso lado escuro. O problema com o ódio é que é gostoso senti-lo queimando nas veias, é narcótico poderoso, vicia, e passamos a adorá-lo como um deus nefasto, e erguemos sua catedral negra e viramos devoto, discípulo dele, e assim caímos em sua armadilha, porque ele passa a nos orientar a vida, guiar nossos pensamentos, atos, palavras. Ele nos quer escravos.
Quando a vida perde o sentido, muitas vezes, o ódio empresta-lhe um, dá-lhe significado, ainda que o preço cobrado seja alto e venha mais adiante, na forma de uma morte prematura, ou na forma de uma longa vida amesquinhada e medíocre, mantida por ele e para ele, a serviço dele, dedicada a ele. O ódio dorme sob a sombra da nossa consciência, da nossa humanidade e prega o desassossego, a discórdia, o tumulto, é vulto que nos acompanha de perto, sorrateiro, prestes a dar o bote quando nossa imunidade moral fraqueja. O ódio é como um vírus que se apossa do nosso corpo para reproduzir-se contaminando cada vez mais gente para seu exército de dementes, de furiosos, de desesperançados. O ódio é obsessivo, paciente e resoluto, ele odeia seu objeto com constância invejável, não faz concessões, não sente empatia, não diminui sua marcha para a catástrofe, instilando seu veneno em toda e qualquer oportunidade, e se regozijando disso.
Um homem forte não sente ódio, o ódio é para os fracos e covardes, o odiento não pode sentir amor por ninguém, porque o ódio denigri e depaupera o amor, fulano não ama cicrano, fulano odeia beltrano, o ódio é uma mácula no coração de qualquer um, aliás, quem sente ódio não tem coração tem qualquer coisa sombria no lugar, uma pedra, um vazio, um grito, uma noite, bombeando pelo corpo raiva, invídia e vingança. O ódio é a coisa mais relevante na vida do odiento, não deixa espaço para mais nada, o ódio triunfa sobre tudo. O ódio é rei.

Muito cuidado com o ódio que ele vai te roubar tudo: caráter, consciência, humanidade, teus sonhos também (e tu passarás a sonhar os pesadelos dele). Cuidado, muito cuidado mesmo, com este pequeno ódio que alimentas contra alguém (e ingenuamente te delicias com isso), porque a vocação do ódio é crescer, crescer rápida e esmagadoramente, e consumir, consumir tudo, insaciavelmente. Até te consumir, até te engolir inteiro, num vórtice de tragédia e desespero!

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