JP passou horas aprumando o espírito com meditação, malhando os músculos com halteres emprestados à um amigo, customizando a indumentária, engalanando-se para atrair as fêmeas mais susceptíveis e desinformadas sobre seu caráter, enfim, fazendo tudo o que lhe era possível para obter uma ótima performance na festança de logo mais. Tinha a expectativa de copular bastante, e com muitas mulheres (esta era a sua expectativa usual, dado os ótimos resultados de suas séries históricas a respeito do assunto); e quem sabe não fosse seu dia de sorte, indo parar na cama com duas ao mesmo tempo, talvez as gêmeas I. e B., em que punha os olhos esfomeados há tempos, desde a nem tão inocente assim época de colégio...
Acoplou-se ao BMW de quinhentos mil reais, e pisou fundo. À caminho do regozijo, parou num quase arrabalde para comprar baseado, pó, ecstasy, tudo que fosse ilícito e possível de ser comprado e iniciou a viagem ali mesmo, como que calibrando a máquina; transou no banco de trás com suas putinhas preferenciais, enrijecido com os comprimidos azuis (estava sempre preparado para ocasiões especiais); e teve que subornar o merdinha de um guarda de trânsito que teve a ousadia de pará-lo numa blitz: molhou-lhe a mão com 300 pratas e foi-se embora, cantando pneu e mostrando o dedo para a patuleia...
Quando se apresentou na milionária cobertura do Flávio, o anfitrião da festa (o dono da festa era o JP, como de costume), o nosso (anti-)herói já havia fumado dois baseados, cheirado cocaína, ingerido viagra, e bebido whisky. Para a sorte dele o putanheiro tem um coração de aço. É porque, além dos bons genes, o tema saúde não era de todo negligenciado. Quando não sucumbia à perdição, até que acordava cedo, alimentava-se bem, fazia exercícios com certa regularidade. Mas ele sempre quisera conhecer os dois lados de tudo, as duas faces da moeda, estava gravado no ADN dele a busca, e assim mergulhava tanto no calor do dia, quanto nos insondáveis mistérios da noite, profunda, perigosa, e muitas vezes inadvertidamente...
Durante a festa, discutiu seus investimentos milionários no mercado financeiro: derivativos, títulos públicos, letras hipotecárias, etc; palestrou sobre economia internacional com dois especialistas no tema, bebeu, fumou, cheirou, trepou até a exaustão (cansadas das suas costumárias investidas, I. e B. finalmente anuiram com a indecorosa proposta...)
Mas um certo alguém o observara por todas as longas horas da greco-romana festança. Era o irmão do anfitrião, Leonardo, médico bem-sucedido, rico, boa-pinta, e decidida bichona. Éh, Leonardo sempre tivera uma queda por JP, que era tudo quanto um gay não quer para um enlace matrimonial, mas tudo quanto sonha para uma foda estrondosa. E com a cara e a coragem foi abordar seu cotidiano objeto do desejo. Já tinha pensado numa estratégia e estava disposto a pagar qualquer preço para fazê-la operar eficazmente. No começo o papo rolou fácil, sobre diversos temas (como sempre, JP muito simpático e loquaz). As pessoas passavam por eles só para se despedirem, já que passava das quatro e a festa ia minguando. E antes que nosso (anti-)herói também anunciasse sua partida, Leonardo dera seu xeque-mate: ele, que não era chegado à branquinha, convidou JP para ir à seu quarto aspirar a última carreirinha da madrugada; inocentemente JP aceitou; ambos cheiraram a maldita e incontinenti perderam o juízo, mas por motivos diferentes: Leonardo por paixão, JP por quase overdose...
Nosso (anti-)herói acordou às três da tarde, tropeçando nas pernas, a cabeça tilintando como campainha. Estava só. Apenas um recado do Flávio, dizendo que ele comesse alguma coisa e desse as chaves ao porteiro quando se fosse. Desceu o prédio tentando recordar o que acontecera nas últimas horas, mas não conseguiu...
(...)
O que terá acontecido à JP naquele quarto, naquelas possivelmente ultrajantes horas? Desde então, ele nunca conseguiu juntar a necessária coragem para perguntar à Leonardo qualquer coisa sobre o potencialmente vergonhoso incidente, apesar de haverem alguns sórdidos indícios de que algo anti-natural acontecera àquela madrugada, como, por exemplo, o fato de o Leonardo dar-se ares de grande intimidade consigo, além de algumas lembranças confusas, de corar a face. Será mesmo que JP, devorador de mulheres, estivera, enfim, com um homem na cama?! Se sim, teria sido o ativo ou o passivo?
Narrador (quase-)onisciente
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