JP percebeu que podia ouvir com alguma clareza os ruídos que suas amiguinhas faziam, no vestiário ao lado, antes e depois das aulas de educação física, e pôs-se a maquinar que poderia haver, quem sabe – seria bom demais para ser verdade?, um duto de ar que estivesse levando os sons de um vestiário ao outro; começou a procurar, sem chamar atenção, algum possível ponto de ligação entre os dois ambientes; e não é que na parte dos chuveiros havia um duto, estreitinho, muito ao alto, que parecia ligá-los? Ficou arquitetando planos para poder subir até lá, talvez um corpo pequeno e mirrado como o seu coubesse no duto; analisou a parede para ver se, de alguma forma, poderia subir por ela, e após alguns segundos de investigação, concluiu, decepcionado, que era impossível chegar até lá, bem como passar por aquele duto, e sabe-se lá o que teria depois dele, talvez apenas a visão do logradouro...
Mas vejam o que é a mão (ardilosa? benfazeja?) do destino: um mês depois, JP estava na aula de educação física e ficou com vontade de ir ao banheiro, pediu a permissão, foi; no momento em que entrava no vestiário, dois homens estavam saindo e disseram-lhe: “A gente está fazendo uma pequena reforma nos chuveiros, por isso está cheio de material espalhado pelo chão, mas voltamos logo, em vinte minutinhos...” JP deu de ombros, foi até a latrina, fez um longo xixi, e quando voltava à aula, o bichinho da curiosidade lhe picou, e ele voltou atrás para dar uma singela olhadinha na reforma; pois bem, estava lá, magnífica, providencial, do alto dos seus vários metros, uma escada, a escada que ele tanto sonhara um mês antes, a própria mão de Deus a havia posto lá, para que ele pudesse, enfim, ter o seu momento de iluminação, a sua visão do paraíso; incontinenti, arrastou-a cuidadosamente para o lugar onde identificara o suposto duto de ar, e subiu cheio de ansiedade; o duto era estreito e devia ter uns três metros de comprimento, mas ouvia-se claramente os ruídos que as meninas do terceiro ano faziam, voltando da aula de educação física; naquela classe, muitas garotas eram amigas de sua irmã, e algumas eram paqueras que frequentavam a sua casa, além da L., o amor de sua juventude; isso o motivou deveras; sim, faria isso: meteu-se sem muito pensar no duto – só coube ali por causa dos seus 14 anos e seus poucos quilos, e foi arrastando-se devagar e silenciosamente, tinha 15 minutos até a dupla de estraga prazeres voltar; é, ele tinha razão, o duto ligava os dois ambientes: começava a ver parte do outro vestiário; logo depois, já com a cabeça quase no limite do duto, viu as garotas nuas, tomando banho, e viu a sua L., que parecia despir-se sensualmente para ele, peça após peça da indumentária, o sutiã, o jeans, a calcinha... ele quase perdeu os sentidos! JP ficou ali por uns quinze minutos, até a última garota deixar o recinto. Quando tentou voltar, percebeu que não tinha como manobrar seu corpo, não tinha mais aquela adrenalina, os braços estavam praticamente presos, e ele não poderia voltar; inicialmente, entrou em pânico, mas controlou-se, sabia que os caras voltariam logo; esperou-os e eles chegaram um pouco depois; gritou por socorro, bateu as pernas, os caras o viram e o retiraram de lá, às gargalhadas, claro; já no chão, sem ter o que dizer, pediu pelo amor de Deus para que não contassem nada; os dois sujeitos fecharam a cara para fazer-lhe medo, como se dissessem que o denunciariam, mas no fim conseguiram o que queriam, dinheiro: cem pratas na mão de cada um; e o assunto, pelo menos para o grande público findou-se por aí; mas na cabecinha sensual de JP aquelas imagens – verdadeiras delícias do paraíso perdido, levam-no a vertiginosos momentos de delírio ainda hoje...
Narrador onisciente
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