a vida aconteceu
enquanto cultivava a arte
a vida aconteceu
agora, já vai caindo a tarde
e eu não sou mais eu: não sou mais todo, sou parte
a vida aconteceu
enquanto cultivava o riso
a vida aconteceu
no mais caótico improviso
e eu não sou mais eu, destarte
a vida aconteceu
levou
o amor que não pude dar-te
a vida aconteceu
secou
os mares de singrar-te
a vida aconteceu
enquanto cultivava flores
a vida aconteceu
agora, só vicejam as dores
e eu não sou mais eu: sou metade de um homem
a vida aconteceu
enquanto cultivava sonhos
a vida aconteceu
cerrando meus olhos tristonhos
e eu não sou mais eu, sou ontem
a vida aconteceu
doeu
agora a vida me consome
a vida aconteceu
não sou mais eu
sou o que não tem nome
*
Amanheci do meu mistério
Agora me compreendo
Não significa que me goste
Compreendo-me apenas
Não tenho nada a ensinar a ninguém
Não tenho nada a dizer a ninguém
Não tenho nada a aprender com ninguém
Não tenho nada a ouvir de ninguém
A poça é rasa
A água está parada
No limo, infestações proliferam
Eu matei a charada, que não significava nada
Eu nunca fora culpado, mas nunca serei inocente
Tudo é absurdo, vão, escuro, sujo, feio e fede
insuportavelmente...
Amanheci do meu mistério
Que pena
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