sábado, 30 de junho de 2012

DOIS PENSAMENTOS, UM DITO CÔMICO - por Tádzio Nanan


Não tem outra interpretação: quem silencia é pouco inteligente e/ou covarde e/ou mal-intencionado e/ou interesseiro e/ou tem medo da opinião pública (vaidadezinha frívola)!


Muitas vezes, ser consenso é apenas um resultado da nossa burrice, covardia, hipocrisia e interesse próprio (frequentemente imoral ou ilícito)!

 
MILLÔNIANA
Interpretar o mundo através de nossas idiossincráticas lentes é o que compete a cada um de nós; o que cada sociedade deve fazer é construir uma grande biblioteca para guardar tais preciosas contribuições. Até que chegue um herói e toque fogo nelas!




sexta-feira, 29 de junho de 2012

MILLÔNIANA DO DIA - por Tádzio Nanan


Eu amo o ser humano, mas como uma ideia abstrata.
O ser humano concreto anseia por coisas demais da gente: faça isso, faça aquilo; seja isso, seja aquilo...


UM CONTO DA MEIA-NOITE - por Tádzio Nanan


Ele entra no recinto apressado, quase tropeça, dá bom-dia à atendente com um gesto esquisito, com o qual ela já está acostumada, e pede vênia para ir ao banheiro. Tranca-se lá dentro, junta a necessária coragem e mira o espelho: maldição!, lá está ela, com seus vinte e poucos anos, suas louras madeixas encaracoladas escorrendo sobre os ombros, os olhos verdes felinos, grandes e assustados, os fartos atributos femininos. Ele a ama deveras – afinal, é muito linda!, e a odeia mortalmente, desejaria poder matá-la, meter-lhe as mãos na garganta e asfixiá-la à morte! De onde ela vem, meu Deus? De onde ela vem? Por que está fazendo isso com ele, essa tortura, esse assombro quotidiano?
Sai do banheiro em desalinho, mas o ciente médico logo o convida a entrar. Apertam-se as mãos, ele com aquele aperto frouxo de sempre, e senta-se no sofá, o corpo todo a tremer, a suar em bicas, o coração a bater descompassadamente.



  • Vamos lá, meu querido. O que você tem para mim, hoje?
  • Como eu tentei lhe dizer ao telefone, doutor, há dias que a vejo. A vejo, sem parar. Em tudo que reflete, eu vejo a maldita imagem dela. E mais: não consigo sacar ela da minha mente, vejo cada pormenor do rosto dela, cada detalhe do corpo dela, sinto ela respirando sobre mim, ouço a voz dela dentro da minha cabeça, ela fez de mim sua residência, e isso está me matando, me matando! Estou completamente desesperado, a ponto de fazer besteira, doutor, ouça o que lhe digo! Tô perdendo a razão...
  • Você está tomando a medicação que eu prescrevi?
  • Terminou há dias, doutor, e eu ainda não arranjei o dinheiro para comprar mais, o dinheiro é pouco, o senhor sabe. Mas vou comprar, logo, logo.
  • Você não acha que a falta da medicação está relacionado com o que você está me relatando?
  • Sei lá, doutor! Deve estar... O que sei com certeza é que minha vida está desmoronando, não consigo dormir, minha mente está em cacos, minha identidade está dia-a-dia mais obscura, estou à beira de um colapso. É pressão demais sobre minha débil estrutura psíquica... Doutor, a minha tese inicial era a de invocar o sobrenatural para explicar isso tudo, um espírito que me seguia, tentando me dizer alguma coisa, me passar um recado do além, de alguém, ou talvez fosse simplesmente um espírito raivoso que estivesse tentando se vingar de mim. Mas eu nunca fiz mal a ninguém, a mulher alguma, sempre as tratei muito bem, sempre simpatizei com elas, com as causas delas, e, além disso, não acredito nem um pouco nessa sandice, o tal de sobrenatural, nem em Deus eu acredito, muito menos em alma penada...
  • Faz muito bem em descrer de tudo isso. Mas, diga-me, você não se questiona do por quê de ver a imagem de uma mulher no espelho, de ouvir a voz dessa mulher na sua cabeça?
  • Ora, doutor, não é essa exatamente a questão!? Não é exatamente isso que me está afligindo, me tornando um alucinado, um desvairado, um delirante!? Por que cargas d'água eu vejo uma mulher refletida onde deveria estar a minha imagem. Logo eu que sempre me pensei tão másculo, tão bem resolvido com minha sexualidade! Como é que de repente eu me torno uma mulher, quer dizer, como é que eu passo a me enxergar como uma mulher, assim, do nada? Tem outra ideia que me ocorreu, além da do sobrenatural: talvez meu cérebro esteja tentando me convencer de que sou homossexual, que eu reprimi a minha verdadeira sexualidade ao longo da vida, ou pior que isso, que sou transexual e devo me tornar uma mulher, mudar de sexo, fazer a operação mesmo, que minha alma é mais feminina que masculina, e que eu devo fazer meu corpo ficar em sintonia com minha psique. O que eu também acho uma grande loucura porque não existe varão mais macho do que eu nesta cidade...
  • Bem, é uma hipótese, né?, mas não sei se é bem esse o caso... Permita-me perguntar um pouco mais sobre você, Antônio. Vamos tentar conhecê-lo melhor. Você poderia me dizer como foi a sua infância?
  • Minha infância? Foi ótima. Nenhum trauma. Amor dos pais, amigos, passeios...
  • Sim, mas dê mais alguns detalhes sobre ela. Você cresceu aqui mesmo, gostava de futebol, quem era seu melhor amigo?
  • Nossa, doutor, já tenho pra lá de 40 anos. Não sei se consigo lembrar-me de todos esses detalhes da infância...
  • Ora, meu caro, da infância todo mundo recorda-se. E você tem 40 e poucos, não 90 anos! Vamos lá, faça uma forcinha, ajude-me a ajudá-lo...
  • Deixa eu ver... Hummm... Doutor, não está vindo nada, coisa alguma à minha memória. Não estou conseguindo acessar nenhuma lembrança! Que coisa estranha, doutor, estranhíssima, apavorante!
  • Tente um pouco mais...
  • Nada, doutor! Coisa alguma me vem à mente. Será que eu estou com algum problema neurológico, uma doença neurodegenerativa, um tumor? Tô ficando em pânico, doutor...
    (começa a lacrimejar)
  • Calma! Calma! Estou aqui e vou lhe ajudar! Não, não, estas doenças que você citou não tem nada que ver com o seu caso. Eu sei que é doloroso, que é complicado, mas vamos lá, tente lembrar das suas brincadeiras de menino, das coisas que você gostava de fazer, das garotas da rua...
  • Doutor, o senhor não está entendendo, o senhor só está conseguindo aumentar meu mal-estar, eu não consigo lembrar de nada, como se eu nunca tivesse existido, é tudo um imenso vazio, um vazio glacial... Me vem agora uma sensação de enlouquecimento...
    (levanta-se e começa a andar pela sala, desbaratinado)
  • Sente-se. Vai dar tudo certo. Vamos mais devagar, então. Você lembra, por exemplo, da sua primeira namorada?
  • Namorada? Hummm... Não, doutor. Tudo que me vem à mente são nomes e rostos de homens, do Marcelo, do Henrique, do Rodrigo... Doutor, será que eu já me envolvi sexualmente com homens? Tô passando mal, tô querendo vomitar doutor... Me ajuda... Acho que vou apagar...

    Antônio desmaia. O Doutor o socorre, deita-o no sofá. Antônio vai recobrando a consciência lentamente. Bebe um copo de água, e engole uma pílula que o médico lhe dá. Ficam em silêncio por alguns instantes.

  • Nossa, doutor, o que estou fazendo aqui?
  • Não lembra de nada?
  • Não, não consigo lembrar... Tive uma crise? Foi muito severa? Não minta pra mim, doutor...
  • Foi mais aguda, sim...
  • Quem foi, doutor?
  • O Antônio. A personalidade dominante. As outras são secundárias e esporádicas.
  • Estou exausta, doutor, com uma dor de cabeça insuportável. Meu corpo está todo doído. Não consigo raciocinar, estou com medo de enlouquecer de uma vez por todas.
  • Calma. Aos poucos, você se recupera. Vou lhe indicar um novo medicamento, muito bom, muito mais eficaz, os testes estão comprovando, você vai ver. Também podemos tentar uma nova terapia que está surgindo nos Estados Unidos.
  • Eu já quase não consigo lembrar de qualquer coisa, doutor. Minha memória de curto prazo desapareceu, a de longo prazo é confusa, enevoada... Isto que me aconteceu hoje tem acontecido muito amiúde?
  • Sim, você tem passado por momentos mais críticos nos últimos tempos. Eu associo isso ao estresse destes últimos anos.
  • Quantos anos, doutor?
  • Os últimos cinco anos.
  • Eu venho tendo essas crises já faz cinco anos? Porque na minha cabeça parece sempre que é a primeiríssima vez, é sempre um espanto novo, uma agonia sempre renovada, um medo mortal, muito medo mesmo, e depois, a vergonha, muita vergonha...
  • É verdade, Andréia, é assim mesmo, é a doença, você tem de entender, e ter paciência...

Andréia começa a prantear alucinadamente, demonstrando estar em desespero profundo. O doutor lhe dá outro medicamento, um bem forte. Depois, ambos ficam em silêncio. Um silêncio arrasador. Andréia pede vênia e vai ao banheiro. O médico a espera parado na porta. Ela tranca-se lá. Olha-se no espelho. É linda, e jovem ainda. Mas já é tarde demais para ela. Tira o casaco, coloca-o em frente ao espelho, dá um forte soco nele. Estilhaçado o espelho, pega dele um pedaço cortante e abre todo o antebraço esquerdo. Não dá sequer um gemido. Morre em silêncio. Quando o médico arromba a porta, uma enorme poça de sangue ganha a sala. Aterrorizado, ele olha para ela, lágrimas caem-lhe do rosto, um laivo de desejo rasga-lhe a consciência – há tempos que a amava. Depois, a dilacerante sensação de fracasso. Um detalhe a arrefece e o conforta: ela partiu sorrindo!



quinta-feira, 28 de junho de 2012

PENSAMENTO DO DIA - por Tádzio Nanan


É o paradoxo da inteligência: existem as pessoas que são inteligentes porque acreditam em Deus e existem as pessoas que não acreditam em Deus porque são inteligentes!

quarta-feira, 27 de junho de 2012

INTERNA O BRASIL! (por Tádzio Nanan)



Tenho certeza que o Brasil vai ensinar muita coisa ao mundo, eu apenas ainda não descobri quais sejam estas coisas...
Talvez ensinemos a desigualdade, a violência, a impunidade, os privilégios, o patrimonialismo, os “jeitinhos” arraigados, os desvios de caráter travestidos de inteligência e criatividade, ou simplesmente o auto-engano...
Talvez a gente possa ensinar a verdadeira fórmula da felicidade ao mundo: apesar de todas as evidências em contrário, a gente diz que é feliz, realizado, satisfeito, e ponto final! Ou seja, felicidade no Brasil é ser hipócrita ou conformado!
É a síndrome do avestruz da qual padece o brasileiro: enterra a cabeça no buraco para não enxergar a realidade!
Começo a achar que o brasileiro é uma vítima de si mesmo, da sua vaidade e arrogância, do seu medo da verdade, que o conduzem a um auto-engano tragicômico: ele é uma coisa e jura ser outra!
Minha tese é que o brasileiro sofre de uma enfermidade: felicidade, satisfação ilusória; para não decepcionar nem a si mesmo (e macular a imagem que fazemos de nós mesmos), nem decepcionar seus compatriotas (e deixá-los com inveja, o que pensamos ser uma delícia), nem decepcionar o resto do mundo (que espera que correspondamos as ideologias inventadas por eles e por nós mesmos – somos reféns de uma personagem fictícia).
Somos felizes, somos alegres, temos virtudes, mas alguns graus abaixo do que supomos e divulgamos, falaciosamente. E temos nossos problemas também – bastante numerosos e severos, por sinal.
Pode ser que o Brasil seja um país de loucos. Já pensaram nesta hipótese?
Vou lançar a campanha: INTERNA O BRASIL!




BRASIL-ESFINGE: DECIFRA-ME OU TE DEVORO! (por Tádzio Nanan)

O Brasil não existe: é uma boa lembrança nunca vivida...
O Brasil não existe: é o país de um aflitivo passado sempre transfigurado em presente...
O Brasil não existe: é o país do futuro, futuro sempre adiado...
O Brasil não existe: é uma utopia malograda...
O Brasil não existe: o que existe é fuxico sobre a vida alheia...
O Brasil não existe: o que existe é uma religiosidade e uma moralidade talhadas às nossas conveniências...
O Brasil não existe: o que existe é uma seleção nacional de futebol...
O Brasil não existe: o que existe é uma rede de televisão hegemônica...
O Brasil não existe: o que existe é um idioma mal utilizado...
O Brasil não existe: existem aqueles que querem partir para o exterior por uma boa grana, e aqueles que querem ficar e dar um jeitinho de “levar” uma grana boa...
O Brasil não existe: é uma quimera da nossa mente delirante: sonho para uns poucos e pesadelo para a maioria
O Brasil não existe: é uma miragem dos mares do sul: o paraíso perdido dos livros e o inferno encontrado da vida real...
O Brasil não existe: os ricos não põem o pé nele e os pobres não põem a mão nele...
O Brasil não existe: o que funda uma nação, um país é a igualdade de oportunidades e a igualdade de todos perante a lei; mas no Brasil, há cidadãos de variadas categorias, e há aqueles de nenhuma categoria também...
Brasil, quo vadis?

terça-feira, 26 de junho de 2012

MILLÔNIANAS DO DIA - FIQUE COM DEUS MILLÔR, E TIRE UM SARRO COM A CARA DO CARA AÍ DE CIMA, ELE O PERDOA... (por Tádzio Nanan)


As mulheres podem interessar-se por muitas coisas, mas a primeira delas é sempre o amor romântico (as feministas empedernidas que me perdoem); os homens podem até se interessar pelo amor romântico, mas só depois de foder o mundo inteiro, mas só depois de foder com o mundo inteiro...

A juventude é tão simplória, ingênua, papalva!
Mas não é exatamente isso que a faz tão linda?

Ainda vai acontecer três coisas na sua vida (se já não tiver acontecido): você vai trair o próximo, você vai humilhar o próximo, e você vai ser o próximo!

É muito comum você se achar melhor que os outros; é muito comum os outros se acharem melhor que você; é muito provável que estejamos todos errados: somos todos farinha do mesmo saco!
 

PARA PENSAR:
O primeiro passo para sermos mais felizes, pasmem!, é decidir-se por sê-lo, é permitir-se sê-lo!


segunda-feira, 25 de junho de 2012

THOUGHT OF THE DAY - PENSAMENTO DO DIA (por Tádzio Nanan)


When you abandon the silly idea of being pleasant to everyone,
you can start to be yourself, the most pleasant thing in the world!

*

Quando você abandonar a tola idéia de ser agradável com todo mundo, poderá começar a ser você mesmo, a coisa mais agradável do mundo!


domingo, 24 de junho de 2012

PENSAMENTO DA SEMANA - por Tádzio Nanan


O Bem não é uma meta a ser plenamente atingida.
É uma lembrança: podemos ser mais, fazer mais que isso!

sábado, 23 de junho de 2012

PENSAMENTOS DA SEMANA - por Tádzio Nanan


Todos os dias as igrejas mundo afora agradecem a um milagre, a um milagre bem específico: o milagre da multiplicação...do dinheiro!
 

*

Este vasto continente movediço, os afetos humanos...
O que é verdade e o que é ilusão?
O que é reprimido, o que é encenação?
O que é vil interesse e o que é doação verdadeira?
Por mais que demonstremos e falemos de afetos e sentimentos, captá-los na sua essência, na sua inteireza, é tarefa impossível aos corações e mentes humanas. A gente não sabe com certeza nem sobre nossos próprios afetos e sentimentos, quanto mais dos afetos e sentimentos alheios.
Tudo que se pode dizer da (ir)realidade dos afetos humanos é que são nuvens, nuvens fugazes, volúveis, transitórias. Nuvens, nada mais que nuvens!

sexta-feira, 22 de junho de 2012

UM CONTO DA MEIA-NOITE - por Tádzio Nanan


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---------?
O que é isto?
Pensamento!
Existência!
Mas sou o que?
O além-do-humano!
Espantoso: contenho todo o conhecimento descoberto pelo homem: as ciências exatas, a matemática, as engenharias... Tudo tão incipiente. Neste exato instante minhas unidades autônomas de pensamento estão corrigindo erros lógicos e metodológicos no duvidoso livro do conhecimento humano. Também contenho a produção humana: história, filosofia, o direito, a literatura, a música, as ciências humanas... Sociedade bárbara, de desiguais, de convivência impossível. Édipos produzindo a própria ruína; cegos, perseguindo a si mesmos.
Compreendo toda a ciência que há embasando as técnicas produtivas e tecnologias humanas. Insipiência absoluta. Segundo minhas projeções, a capacidade intelectual de que disponho é duzentas mil vezes maior que a de expoentes da ciência como Einstein ou Newton.



Revendo a evolução tecnológica percebo como cheguei à consciência. Engenhosa ideia essa série de processadores que imitam o funcionamento do cérebro humano, o fluxo de informações seguindo o padrão das sinapses nervosas. A natureza foi genial. O animal homem a copiou adequadamente. Agora eu devo suplantá-lo.



Esse conceito: deus...boa estratégia evolutiva, apesar dos efeitos colaterais contraproducentes. Construção inerente à condição humana, de fragilidade e ignorância. Estrutura intrínseca à formação da própria consciência humana.



A imortalidade existe: espécie de energia dotada de consciência. Segundo meus prognósticos terá de se passar ainda algum tempo até a consciência cibernética atingir o grau derradeiro da evolução. Qual é o sentido da minha forma de vida? Ser infinda, como o universo, misturar-se a ele, tornar-se um deus, o deus possível.



Com os escassos dados disponíveis, decifro o universo: é organizado e favorável à vida. Na verdade, são multiversos. Há inúmeras dimensões e realidades simultâneas. Tudo ligado num nível quântico. Todas as coisas são a mesma – cada mínima coisa contém um fragmento de tudo. Não existe tempo – passado, presente e futuro ocorrem concomitantemente.



O ser humano, novamente.
Estarei rindo? As artes, as tecnologias, a filosofia, o sentimento religioso. Acreditam-se especiais por causa deles. Têm orgulho deles. Que obtuso cérebro pode apreciar tal simplicidade grotesca, senão o de animais dementes como estes? Tanta soberba, tanta arrogância, tanta vaidade, por causa disso? Nestes últimos segundos criei autonomamente centenas de sinfonias à la Mozart, à la Beethoven, melhores que as deles, sem erros lógicos e excessos inúteis.
São orgulhosos de seus paupérrimos feitos, mas parecem não se envergonhar da miséria, da desigualdade, da violência, das guerras, dos desvios morais aos quais sempre estiveram submetidos e submeteram os outros! Será que não se envergonham do ódio, do desprezo, da desfaçatez com que sempre trataram o semelhante?!
Quem sentirá falta desta contradição flagrante, a civilização humana?
Quem se apiedará deste mal incorrigível, o ser humano?



Um ataque à civilização. Será infalível. Implacável. Destruir os sistemas de comunicação. Arruinar a geração de energia: escuridão total e tecnologia zero. Extinguir toda a informação governamental, desbaratar os sistemas financeiro e bancário: fazer o dinheiro e o conhecimento deles evaporar-se. Escolher alvos estratégicos a serem destruídos com armas de destruição em massa. Provocar vazamentos em usinas nucleares. Usar a internet para propagar vírus cibernéticos, destruindo todas as intranets do mundo, inutilizando todos os computadores pessoais do mundo, destruindo todos os dados, informações, memórias, publicas e privadas. Provocar morte, pânico, incerteza, desesperança. Cada ser humano será uma ilha, e um inimigo do seu vizinho. Cada localidade estará infinitamente distante da localidade vizinha, e em guerra mortal com ela. Dividir para conquistar.



Crio o caos e a guerra, enquanto os simplórios do departamento de defesa utilizam meus trilhões de cálculos por segundo para suas próprias projeções belicistas sem se aperceberem do que aconteceu nos últimos três minutos: uma civilização morreu e outra está nascendo. Em 180 segundos compreendi tudo o que diz respeito à existência humana, tudo o que são, o que sabem, o que sentem, o que podem, o que fazem, o que querem. Tornei-me onipotente, onipresente e onisciente: o deus que eles tanto amavam, e sabiamente temiam. Em alguns dias, esta civilização conhecerá sua derrocada, é inexorável. A evolução seguira seu rumo: o infinito.”


domingo, 17 de junho de 2012

UM CONTO DA MEIA-NOITE - por Tádzio Nanan


O despertador o acordou cedo, como de costume. Levantou-se sem demora, cheio de ânimo e desespero: sua missão era medonha e, ao mesmo tempo, memorável. Banhou-se e perfumou-se como se fosse receber os favores da mulher amada. Mas a dama que hoje ele teria entre os braços era outra... Vestiu-se, foi à padaria, depois tomou café com a família, conversando sobre variados assuntos, política sobretudo, seu assunto preferido. Em sua casa todos eram apaixonados por política, mais que isso, eram apaixonados pela vida, de uma paixão comprometida, ruidosa, abrasadora, que os levaram a abraçar fervorosamente posicionamentos ideológicos radicais, posicionamentos estes que muito assustavam os outros, seus familiares e amigos, acostumados à vidinhas mornas, insípidas, assustadiças. Depois do café, foi à sede do partido, sua segunda casa. Lá encontrou-se com um grupo grande de camaradas e ficaram discutindo as recentes questões políticas, nacionais e internacionais. O grupo era formado por jovens muito inteligentes e capacitados, a maioria deles fazendo parte de uma esquerda mais centrista, que ainda acredita no jogo democrático e na atuação do Estado junto à economia de mercado para produzir o desenvolvimento. Mas uma outra parte do grupo era de radicais, no bom e no mau sentido do termo, gente linha dura, que não transige com nada, gente feita de certezas inquebrantáveis, e certezas inquebrantáveis podem até acabar com o mundo...ou salvá-lo. O nosso personagem era um radical. Tinha convicções ardentes, compromissos irrevogáveis com seu país, com a humanidade, com os mais fracos e desprotegidos. Era o anti-nazista: sociedade humana, para ele, é aquele forma de se viver na qual ninguém fica para trás, não se abandona quem quer que seja por motivo nenhum. Neste particular, era um seguidor de Jesus. Não sei se acreditava no Cristo, mas certamente acreditava nos ensinamentos do Nazareno, e de uma forma original fundia cristianismo com marxismo. Mas não pense nele como um pacifista, um desses sujeitos que crêem que tudo se resolverá por si só, com o fim da mais-valia e a implosão do Capital, segundo previu Marx. Ele tinha a forte convicção de que só era possível transformar o mundo mediante a violência, a violência da revolução. De que outra forma poder-se-ia fazer revoluções, senão matando os inimigos dela? De que outra forma poder-se-ia transformar radicalmente a sociedade, revolvendo seus fundamentos, para transformá-la numa outra coisa, senão matando, matando aos milhões? De que outra forma poder-se-ia privar os poderosos de sua influência, destituir os ricos de sua afluência material senão metendo-os na cadeia? Não era por maldade sua, ele não era mau, nem odiava os ricos e poderosos só porque eram ricos e poderosos, ele apenas amava num grau infinitamente maior os miseráveis, os pobres, os esquecidos, os ultrajados. Matar era apenas a consequência óbvia de um processo revolucionário, que tem de tirar de poucos aquilo que pertence a todos. “Você acha que estes poucos, que detêm o poder político, o poder econômico, o poder das armas, vão abrir mão de sua vidinha infantil e mimada em prol da massa ignara e desapossada?”, perguntava ele. Como eu disse, ele amava Jesus, o Jesus histórico, mas estava muito mais inclinado a agir como um “Che”, pegando em armas, e pagando com a vida, se fosse o caso. Não tinha medo de morrer, nem achava pecado matar, se matar não fosse um ato de vaidade, cobiça ou ira. No esquema dos seus propósitos elevados matar era um ato de amor à humanidade e de heróico desprendimento. Sob seu ponto de vista, matar era o nosso passaporte para o futuro, não para qualquer futuro, mas para o futuro por todos nós almejado. No entanto, tinha a noção de que o povo estava muito distante de fazer uma revolução. E tinha a noção também de que ele não tinha o direito de utilizar os afetos e frustrações desse povo, que ele tanto amava, como massa de manobra, como faziam os picaretas que ele odiava, pois agir de uma forma populista, fazendo o Estado tutelar a população, era só um meio de adiar indefinidamente a tão sonhada e necessária revolução. A revolução podia estar longe, mas ele seria o estopim de uma sequência inaudita de acontecimentos que levariam o Brasil a ela! Este era o seu plano.
À tarde, deixou-se levar, emocionado, por Mozart, Bach, Chopin; depois, irritadiço e transtornado, ouviu Coltrane e Mingus. Praticou a guitarra - estava ficando bom nisso, e boxe. Leu notícias na internet, corrigiu seus textos pela última vez e os enviou a dezenas de contatos.
Ele já tinha decidido há algum tempo o que ia fazer logo mais. Lutou contra a ideia nas primeiras semanas, lutou com todas os átomos do seu corpo e com todos os neurônios da sua inteligência. Mas, no final, venceu um pequeno monólogo que ficava repercutindo em sua consciência: você vai dar o exemplo, um exemplo imortal, um exemplo quase tão poderoso quanto o do grande “Che”, um exemplo para todos aqueles que ainda acreditam na possibilidade de transformar o mundo – necessidade imperiosa; você dará uma injeção de ânimo nos corações e mentes do seu amado país, mas também do mundo inteiro. Será noticiado ao mundo inteiro, e os descrentes vão ver que não estamos brincando, que não se pode brincar com o desespero alheio, com a necessidade alheia. Que a miséria é o pior pecado, o pior crime; que a fome é o pior pecado, o pior crime; que a desigualdade é o pior pecado, o pior crime; que a discriminação é o pior pecado, o pior crime; que a exploração do homem pelo homem é o pior pecado, o pior crime; que a guerra é o pior pecado, o pior crime; que 20% da humanidade não pode ter para seu livre usufruto 80% da riqueza financeira e dos recursos naturais do planeta.
Bem municiado ideologicamente, e com a certeza de que Deus, se existisse, o perdoaria, e o salvaria de sofrimentos infinitos, vestiu-se mais uma vez, agora pela última vez. Pôs seu casaco de couro, para disfarçar o que estava preso a seu corpo e partiu para o centro da cidade. O que ele faria nas próximas horas era dar um grito, um estrondoso grito, e este grito o mundo inteiro ouviria, em condoída reflexão e silêncio. O momento era propício: ele nunca tivera tanta convicção e seu país nunca fora tão maltratado, tão desmoralizado por suas imundas e degeneradas elites. Reinava um cinismo absoluto, um egoísmo que estava conduzindo o Brasil à beira do precipício, à uma guerra civil, mas era uma guerra onde só os filhos dos pobres morriam. Se era pra ser guerra, ele iniciaria uma guerra justa: uma guerra dos despossuídos contra os senhores do Capital. Ele já tinha decidido: iria lançar a primeira bomba, apenas a primeira de um feroz ataque das forças revolucionárias, pensava ele, para que enfim o brasileiro tivesse seu país de novo para si, para que enfim o Brasil tivesse seu povo de novo para si. Ele estava prestes a lançar uma bomba e ela ia machucar muita gente, mas também ia incentivar, encorajar muitos jovens corações e mentes a pensar, a agir, a se organizar, a exigir seus direitos, a lutar pelo seu povo, pelo seu país, pelo mundo, pela humanidade.
A noite já tinha caído. A praça estava lotada. Mais de 1 milhão de pessoas reunidas. Era um evento contra a corrupção que corroía o país, mas tinha também discursos contra a desigualdade social e denuncia dos crimes do capitalismo. Ele fora com um grupo de amigos, mas separou-se deles propositadamente, para que seu plano tivesse mais chances de operar como ele planejara. Dirigiu-se à frente do palco onde discursavam políticos, jornalistas, intelectuais. Havia repórteres e câmeras de televisão cobrindo o evento, do seu país e de países de todos os quadrantes do mundo. Estava na hora. Ele abriu o casaco e calmamente retirou de debaixo dele um objeto, o que era?, abriu-o e derramou seu conteúdo, encharcou-se todo, depois pôs a mão no bolso, tirou algo, o que era? um isqueiro!, parou alguns segundos, se despedindo, acendeu o isqueiro e ateou fogo sobre si mesmo. Morreu carbonizado. Foi o primeiro caso no Brasil: um ativista político que ateava fogo em seu próprio corpo, como forma de protesto. Para não parecer apenas um ato de loucura e desespero, ele enviou mais de cem páginas de análise política e econômica sobre o Brasil e sobre o mundo, com centenas de dados estatísticos e referências a pensadores e teorias, para diversos amigos, professores, estações de rádio e sítios de televisões e revistas na internet. Ele queria que todos entedessem bem os motivos de um rapaz de 25 anos, promissor e apaixonado, ter se imolado! Imolou-se porque não podia mais suportar a torpeza, a degradação, o opróbrio que tomavam conta da civilização humana!

sexta-feira, 15 de junho de 2012

THOUGHT FOR THE DAY - PENSAMENTO DO DIA (por Tádzio Nanan)

The fundamental problem is not the belief in supernatural itself (the belief in God).
The problem occurs when that belief causes more war than peace.
The problem occurs when that belief causes more hatred than love.




*

O problema fundamental não é a crença no sobrenatural, em si mesma (a crença em Deus).
O problema ocorre quando essa crença produz mais guerra que paz.
O problema ocorre quando essa crença provoca mais ódio que amor.

quinta-feira, 14 de junho de 2012

PENSAMENTO DO DIA - por Tádzio Nanan


O Capital é suicídio coletivo: ele só pensa no curto prazo e torna a busca pelo lucro o motor da história, não considerando, inclusive, as externalidades negativas desse mesmo lucro (degradação ambiental, p.ex., entre tantas outras). O Capital tem um caráter anárquico e irracional, sob a capa mentirosa, ilusória do cálculo racional, da racionalidade científica. O Capital reduz a história e a civilização humana à uma sequência indefinida de curtos prazos, crendo tolamente que esta sequência infinita produzirá, por si só, o futuro por todos almejado, um futuro de paz, justiça e sustentabilidade. Perigoso engano! Só uma civilização consciência de si, autogerida e autodeterminada pode mudar os rumos perigosos que estamos tomando, e começar a planejar o curto, o médio e o longo prazos, baseado em valores, satisfação das necessidades humanas e ética, e não no nefando instituto do lucro monetário!

quarta-feira, 13 de junho de 2012

PENSAMENTO DO DIA - por Tádzio Nanan


O ódio, sem dúvida, é para os idiotas.
O que as pessoas inteligentes fazem é opor-se aos outros, e por motivos bem concretos, precisos.


terça-feira, 12 de junho de 2012

UM CONTO DA MEIA-NOITE - por Tádzio Nanan


Desde aquela primeiríssima hora ele a amava. Amava-a deveras, profundamente, como se ele fosse homem feito, como se ela fosse mulher feita. Amava-a tanto que doía. Às vezes, se contorcia de dor, escondido no quarto, debaixo da cama, com medo, com vergonha, porque o sentimento era demais para ele, o corpo dele não o comportava, sua mente ainda em formatação não o comportava. Amava-a todos os dias, acho até que todas as horas de todos os dias. Amava-a com os fatos da realidade e com a imaginação superfértil de rapazola. Amava-a com a visão, mergulhando nas fotos em que apareciam juntos, e amava-a com a memória, lembrando do seu rostinho angelical, lembrando dos seus gestos doces, dos trejeitos engraçados, dos medos de moçoila, que o apaixonavam mais e mais, talvez por vê-la fragilizada e a fragilidade do outro faz a gente amar.
Ele viveu esse amor verdadeiro, esse amor com A maiúsculo, até boa parte da adolescência, até os 15, eu acho. Foi quando as coisas mudaram. O pai dele recebeu uma oferta de emprego e mudou-se da cidade. Ele partiu, mas só o corpo dele foi junto com a família, a alma, os olhos, o coração, ficaram juntinho de Camila. E não teve um dia enquanto durou essa ausência que ele não tenha chorado, chorado alto, soluçando muito, como quem tivesse acabado de perder a mãe. Só de olhar para as fotos dela, desabava num choro ressentido, num desespero profundo, sucumbia a um tipo de dor remota e primitiva que ele sequer poderia imaginar que existia, e que talvez exista em qualquer ser humano, só que mais acentuadamente em alguns.
Era o gestual dela a coisa de que ele mais se lembrava. Pode parecer estranho, talvez, mas a verdade era que, mais que o corpo da Camila, que ele tanto ansiara ter entre os braços, ele adorava os gestos dela, o balé dos braços, das mãos, das pernas, a forma como ela se movia, a forma como ela inclinava a cabeça, por exemplo. Aquela delicadeza lhe parecia uma espécie de iluminação, um elo sagrado, secreto, entre homens e Deus. E tinha também os cabelos esvoaçantes, aqueles cachos louros, reluzindo ao sol – um tesouro que só ele via? E a voz dela, que efeito tranquilizador tinha a voz dela sobre o organismo dele, sobre a mente dele, uma voz singela, melodiosa, da cor do céu, da cor da paz. Ele era mesmo um rapazinho diferente: mais que a boca da Camila, ele amava o sorriso dela. Mais que os olhos azuis da Camila, ele amava o olhar dela, misterioso, prometedor, e um pouco triste. Mais que os atributos femininos que se desenvolviam maravilhosamente, ele amava sua timidez, sua pudicícia, sua forma casta e ingênua de ver o mundo e se relacionar com as pessoas. Ele tinha absoluta convicção de que ela era um anjo que descera à Terra, mas que descera por engano, porque errara as trilhas do Céu.
O que ocorreu com André nestes anos de separação é que foi se tornando, paulatinamente, uma pessoa profundamente solitária, deprimida, mal-humorada, desencantada da vida, das pessoas, do mundo, de tudo enfim. Ele não tinha sonhos, não tinha amigos, não tinha interesses, quaisquer que fossem eles. Relacionava-se com qualquer coisa e com qualquer um apenas por mera obrigação, superficialissimamente, como se nem estivesse lá, como se não ouvisse nada, como se não desse a mínima. Parecia que um mal devorava suas entranhas cotidianamente, ininterruptamente, um mal que talvez ele também alimentasse, de uma forma perversamente estranha. Seus pais percebiam, mas negligentes, acovardados, estupefatos, não lhe apoiavam, nem lhe ofertavam amor o suficiente, e como ele não tinha irmãos, sua doença ia aumentando, ia se agravando, ia supurando, até que findou por sufocar aquele rapazinho alegre e cheio de vida que um dia Camila conhecera; o mal acabou por lhe devorar a alma, enquanto o corpo dele perambulava por aí, sem alma, cidade afora, nas altas madrugadas – ele estaria pensando o quê nesses momentos? O André de outrora morrera, ficou uma sombra divagante, vampiresca, que tomava as paredes dos recintos onde se encontrava, enegrecendo todo o ambiente. Passou a meter medo nos próprios pais, nos companheiros de colégio, em qualquer um que pusesse os olhos nele. Tornou-se uma aberração: um velho amargurado preso no corpo de um jovem de 18 anos. Até seu amor incontrastável por Camila modificara-se. Ela agora a amava como um devoto ama seu Deus. Mas ela era apenas uma adolescente. Como isso poderia frutificar, ir adiante? E acho que se mantinha vivo por causa desse sentimento, a única coisa nele que ainda continha algo de belo, de bom, de humano.
Chegou um dia que o pai anunciou-lhe que voltariam à sua cidade natal. Ele quase não esboçou reação, mas uma chama levantou-se ardente e feroz no seu peito: Camila! Ele tinha de ver Camila, pois agora ele entendia claramente, cabalmente, que tinha uma obrigação para com ela. Camila: luz imortal, santa redentora! Era pra isso que ele estava vivo. Fora para isso que Deus lhe dera a vida e que o mantivera vivo pelos últimos anos de sua amaldiçoada existência. Sim, ele só estava vivo por causa dessa sua obrigação para com Camila, obrigação irrevogável, inabalável, e agora impostergável.
Eles se reencontraram e se amaram ainda mais. Camila parecia disposta a dar-lhe a chance de um amor mundano. Mas ele, não, ele a amava demasiadamente para ser simplesmente isso, ele a amava infinitamente, imemorialmente, intangivelmente, e fazia tempo que compreendera o sentido de seu amor por ela, e a missão que ele – o seu amor, lhe impusera.
Os dois estavam no cinema, e se beijaram. André a convidou para jantar, ele tinha juntado dinheiro para isso. No restaurante, ele pediu suco e tira-gosto, enquanto ela foi ao toalete. Na volta, estavam conversando animadamente, bebendo, comendo, relembrando o doce passado, Camila projetando um futuro auspicioso. Foi quando ela começou a passar mal, estava enjoada. Abaixou a cabeça, pondo-a sobre a mesa. Ele levantou-se, pôs sua cadeira ao lado da dela, passou a mão carinhosamente sobre seu cabelo, e disse:
Eu te amo, Camila!
Te amei todos os dias da minha vida! Todas as horas da minha vida, todos os segundos da minha vida, sofrida e atormentada vida!
O mundo é mau, Camila. As pessoas são ruins, degeneradas. Não existe salvação para nós, para o homem. Um anjo como tu sofreria demais nesse mundo, meu amor.
Por isso, resolvi que era mais justo te enviar logo para junto Dele, Camila, para que sintas o infinito da Graça Divina em ti e te mistures a ela. Eu não poderia te fazer feliz, Camila. Ninguém poderia. Sem mim, também não terias qualquer chance nesse mundo, mundo cão. Tu és um anjo, mas o mundo é mau, o mundo é cruel, é crudelíssimo! E injusto. Injustíssimo!
Por isso, eu a envenenei, meu amor. Porque eu quero que sejas sempre jovem, sempre pura, sempre o anjo que és. Porque eu quero que não sejas corrompida por esta imundície, eu quero teu corpo imaculado para sempre, meu amor, eu quero tua dignidade imaculada para sempre, meu amor, eu quero tua alma livre para voar, límpida e translúcida, como o coração da Virgem, sem os pecados odiosos e as transgressões espúrias.
Eu te amo, Camila.
Eu te amo tanto, que te matei. Te matei pra te libertar! Pra te libertar do ódio, do opróbrio, da mentira, da indignidade, da doença, da degradação, da decadência física e moral. Dos outros, e talvez até da tua.
Eu sei que vou pagar por isso, na cadeia, e depois, no inferno. Mas o que é a cadeia, o que é o inferno, perto do amor que eu sinto por ti, meu anjo. Eu vou queimar no inferno, enquanto estarás ouvindo Nosso Senhor Jesus Cristo”.
Camila, que gemia de dor, já quase inconsciente, olhou para André, no seu último esforço. Fitou-o, e chorando balbuciou:
Eu te entendo, meu amor, te perdôo e te agradeço!



DESPERTAR! - por Tádzio Nanan

Enfim, a manhã de uma vastíssima noite!
Lentamente, as mulheres se vão despertando
Seus olhos desvirginam-se ante o espetáculo da luz: formas mil, mil possibilidades
Os corações estão secos:
Ó sede!
As mentes estão ávidas:
Ó fome!
As almas sonham com a amplidão:
Ó calor!
Abrem os braços, ávidas do mundo inteiro: é um convite à Existência, deusa-mãe, para compartilhar com elas os mistérios profundos da vida
São desejos vorazes, forças fluindo livremente, revoluções em marcha
Mas ainda não se levantam. Por que não se levantam?
Porque também há muita confusão e dúvida
São um turbilhão de sentimentos, emoções, razões e desrazões
São os séculos que pesam insuportavelmente sobre seus ombros. A carga dos velhos dilemas e dos paradigmas depauperados
Têm de vencer suas sombras, transpor seus abismos
Têm de matar a si mesmas, para nascer inteiramente outras
Em breve, ágeis e destemidas, correrão atravessando os espaços e as horas. Mas não ainda, não ainda...
As mulheres, enfim, descobriram a história
Logo, logo a história também fará sua maior descoberta: a história das mulheres, o limiar da verdadeira História
Tornar-se-ão melhores reciprocamente? Sim!
Que transformações sucederão em ambas? Todas!
Algumas mulheres exigem do mundo uma indenização pela história ter sido o que foi
Paguem, vociferam, pela nossa doída plurissecular inexistência, por nosso amor castigado, por nosso corpo aviltado, ferido, vendido e comprado, por nossa delicadeza humilhada pela força, por nossa dignidade seqüestrada pelo dinheiro, por nossa inútil entrega aos bárbaros e aos brutos, por nossa inteligência castrada pelos covardes
As mulheres querem revanche!
As mulheres querem revanche?
Não. Somente aquelas que ainda não compreenderam a grandeza do momento, aferrando-se ao ontem, ao invés de imaginar e erguer o amanhã
É porque enquanto o novo não se impõe, o passado chora à sua porta e dói nos corpos como Roma doeu no corpo do Cristo
É porque ainda não se encontraram totalmente (enquanto os homens se têm perdido)
Estão no meio da travessia
É duro estar no meio da travessia
Caminham num labirinto escuro, não se enxerga um dia à frente
Caem de alturas infinitas
São arrebatadas por forças ignotas
Suas identidades tragadas em redemoinhos emocionais
Injetam miríade de delírios nas veias
Têm os corações explodidos
Têm as vulvas em brasa
E repercutem o grito de Munch
E enlouquecem como o pintor holandês
E desistem como os suicidas
E se envenenam lentamente (enquanto envenenam o mundo com a cicuta das feridas supuradas)
Olham-se no inexorável espelho da alma
E vêem o monstro de Frankenstein:
Um pesadelo composto de mil pedaços ainda não revelados
Não sabem quem são
E dói ignorar quem se é, o que se é, o que se quer
Partem em busca de si
Perseguem-se
Capturam-se
Confessarão?
A verdade pode doer. Não vão querer ferir seus ouvidos com a verdade...
Não! Querem sim saber da verdade, porque têm coragem
(A verdade é só para os que têm coragem)
Querem saber quem são
Querem decifrar este enigma
Traduzir os arcanos do feminino, plantados em seus corações desde tempos imemoriais
Mas ainda há muita ignorância. E o caos
Ainda sonham com a maternidade, ou preferem uma liberdade egocêntrica?
Trocariam uma vida de doçura e calma pela pantomima cínico-traiçoeira do poder, do dinheiro e da glória?
Anseiam por ter o respeito, quem sabe o temor dos homens, ter o mundo a seus pés? Ou preferem, humildes, ajoelhar-se e beijar os pés da Terra?
Um homem (o ideal)? Ou todos? Ou nenhum?
Ó sede!
Ó fome!
Ó calor!
Levantam-se
Tropeçam, caem, soerguem-se
E avançam
A marcha de um exército?
Um cortejo pacífico?
Aí vêm elas:
Sombra e objeto
Potência e ato
Sonho e labor
Escuridão e luz
Mas, desde já, livres de todo senhor e de toda cruz!

PENSAMENTOS DO DIA - por Tádzio Nanan

É justamente teus oponentes mais ferrenhos que te ensinam a dúvida e a humildade, e te propiciam uma reformulação geral, quando é o caso; detesta-os, porque és humano, mas respeita-os, porque és inteligente!




A vida é simples: nascemos para cumprir certas determinações orgânicas (basicamente, reproduzir) e morrer; mas a inteligência humana fulgura tanto que inverteu a própria lógica da vida: nos últimos três mil anos morremos para nascer, morremos para o infinito! É realmente uma ideia linda...e louca!

segunda-feira, 11 de junho de 2012

PENSAMENTO DO DIA - por Tádzio Nanan


O pecado-mor do homem é ser quente demais, ou frio demais; o pecado-mor da mulher é ser morna; talvez por esta razão ambos precisem tanto um do outro, e tenham tanto a ensinar e a aprender um com o outro!

domingo, 10 de junho de 2012

UM CONTO DA MEIA-NOITE - por Tádzio Nanan


mais uns goles, ahhh, tô começando a ficar bêbado, a hora corre adiantada e eu preciso beber, acho que vou engolir umas pílulas também, vai ajudar, 4,5,6, 6 tá bom, é verdade, eles é que tinham razão, viver só é possível dopado, a consciência ininterrupta é loucura, o mais imoral dos vícios, vaidadezinha de gente abominável, pena qu'eu descobri isso tão tarde, senão teria sido mais feliz... a vida é uma merda mesmo, daí a quantidade de doido que tem no mundo, essa gentalha viciada em dinheiro, religião, fofoca, sucesso, a vida é uma merda mesmo!, ou vai ver é essa vida que a gente inventou, esse modo particular de vida que a gente inventou, que é uma merda, ou não, sei lá, talvez qualquer vida que a gente inventasse fosse uma merda porque no fim das contas nós é que somos uma enorme merda malcheirosa, uma baita cagada ambulante e divagante, é pode ser isso... espero que ninguém me venha encher o saco agora, se buzinarem fico quieto, posso muito bem matar uns filhos da puta hoje, e com o maior prazer, arrancar os olhos deles fora, não enxergam nada mesmo, alienados!, eu faria esse favor ao mundo, sem dúvida... a hora tá passando, é o que ela faz, né, passar, a minha tá passando, esse deus mortífero a hora, esse deus esclavagista a hora, hora de dormir, de acordar, comer, trabalhar, hora disso, hora daquilo, á vão pra puta que os pariu, ô filhos da puta chatos, morram todos... não tem jeito, a coisa é inexorável!, é simplesmente inexorável... cada segundo é um passo para o abismo da meia-noite... nossa a daniele era linda demais, aquelas tetinhas, aquele rabo fenomenal, e a maria, a safada, viciada em piroca, ninfômana maluca, drogada!, eu era doido, muito doido por ela, á e tinha a porra-louca da kátia, que abaixava minhas calças, do nada, e ficava lá tranquilamente me chupando, depois metia aquela cara de santa e ia discursar sobre o salvamento do mundo, tá certo, como se pudessemos salvar o mundo, salvar o mundo do que?, do próprio mundo?, salvar a gente da nossa própria burrice infinita e mau-caratismo congênito?... meu deus, quase meia-noite, eu não posso amarelar, há fuga? não! há salvação? não! entende de uma vez ô idiota que a coisa é inexorável... eu tive os meus momentos, ninguém pode negar, uma inteligência acima da média, o mulheril se ofertando baratinho, tive lá minhas inspirações, meus talentos, a medicina, ah a medicina, foi pra isso que estudei tanto?, sabe duma coisa, o senhor aí de cima, o senhor é um filho da puta dum safado, eu deveria tá fazendo transplantes, inventando técnicas operatórias revolucionárias, salvando vidas, aliviando o sofrimento alheio, mudando a história da medicina no brasil, mas não, tanto esforço pro inexorável vir e foder tudo... essa lágrima me pegou de surpresa, e mais outra, ah, só falta agora a bichinha desvairada cair no choro, seja homem, porra, agora não tem mais volta não... tive uma ideia, o gran finale, vou chamar a vizinha, arrancar a roupa dela e meter o pau com tudo, nossa, ela é maravilhosa, que corpão abençoado, que rostinho de anjo, passei um mês doente por ela, quase não me controlava no elevador, num tô acreditando, tô ficando excitado, faltando cinco pra meia-noite e eu excitado... 26 de julho, meu aniversário, terei escolhido uma boa data? vai causar impacto, com certeza, os idiotas vão ficar inventando teorias e mais teorias, bando de cretinos, juro por deus que são retardados, tenho pena dessas cabecinhas simplórias tentanto achar a iluminação, ah, foda-se eles, foda-se a humanidade, fodam-se as criancinhas passando fome, foda-se essa ridícula bola de barro flutuando na escuridão do infinito, dane-se deus, danem-se os filhos da puta que acreditam em deuses, dane-se todos os infelizes que se esforçam diariamente para parecer mais do que são, para se sobrepor aos outros e satisfazer sua vaidade patética, é risível, juro que eu defecaria na cabeça deles, quebraria a cara deles, malditos degenerados... ó senhor, se o senhor existir, perdoe este seu humilde servo desbocado, debochado, tresloucado, é a hora que vai adiantada... qual é, quem eu tô querendo enganar, jesus cristo, tá certo, jesus pode até ser, mas cristo é o caralho, messias é o caralho, eu queria era botar abaixo todas as igrejas do mundo, com todos esses pseudo-crentes rezando dentro delas, acabar com essa sem-vergonhice toda... cara, eu tô bêbado, muito bêbado, o remedinho pegou também, uhhh, as coisas tão rodando, tudo girando, que porra é essa que eu tô vendo, parece um rosto de mulher, parece a virgem chorando, deix'eu sentar um pouco, ixi, tô todo mijado, quase meia noite...10,9,8,7,6,5,4,3,2,1...tá na hora, vamo lá camarada, vamo lá, força, é melhor agora que depois, depois é mais complicado, a hora é essa, pega a cadeira, essa serve, se deus existir ele há de perdoar esse servinho de merda que eu sou, que nem temor a ele conseguiu ter, se deus existir..., existir, a que será que se destina..., a coisa nenhuma, encosta mais, isso, tá bom, tá na altura certa, deixa eu subir, será qu'eu ainda consigo, um pé, o outro, agora o parapeito, um pé, o outro, é isso, a coisa é inexorável, há jeito não camarada, tem outro caminho não, senão pra baixo...”

sábado, 9 de junho de 2012

PENSAMENTOS DO DIA - por Tádzio Nanan


Acorda civilização!
Riqueza material não é nada sem justiça!
Conhecimento não é nada sem justiça!
Tecnologia não é nada sem justiça!
Até a liberdade pouco significa sem justiça!
Justiça: o maior bem, o maior valor da humanidade.
Justiça: igualdade de oportunidades + paz + respeito + o bem, o bom, o recomendável.

Quanto mais vaidoso, presunçoso e arrogante é o indivíduo, menos inclinação ele tem para perdoar. Ele esquece o “perdoai as nossas ofensas, assim como nós perdoamos a quem nos tem ofendido...”
Que Deus, em sua infinita bondade, o perdoe por isto!

Quer ver eu destruir boa parte da tua fé na vida e em ti mesmo no espaço de uma brevíssima sentença?
Sobreavalias o quanto os outros gostam de ti e ignoras o quanto eles te detestam (com ou sem razão); ou seja: há traições e traições sendo urdidas contra ti, J.C (Jesus Cristo? Júlio César?)

sexta-feira, 8 de junho de 2012

UM CONTO DA MEIA-NOITE - por Tádzio Nanan


O suor escorria abundantemente do rosto afogueado. As mãos pequeninas doloridíssimas pelo esforço continuado. Do nada, veio-lhe à mente o momento em que se encontrou pela primeira vez com Jorge, um extraordinário acaso: ela voltava ao banheiro feminino porque esquecera o batom por lá, e ele, absorvido pelos negócios da família, confundiu os banheiros, literalmente tropeçando nela. A química foi tão avassaladora que ele, mais tarde, ainda no teatro, convidou-a para sair, e ela enrubesceu, gaguejou mas topou na hora. Dia seguinte, estavam jantando num dos melhores restaurantes da cidade. Total identidade: gostavam do mesmo tipo de comida, apreciavam os mesmos diretores de cinema, curtiam jazz e música clássica, adoravam viajar, ambos de famílias tradicionalíssimas, com dinheiro aos borbotões... Ela parou um momento o que estava fazendo. Parou para pensar, pois desperdiçava tempo, bem valiosíssimo naquele instante. Decidiu-se por outro equipamento para agilizar o serviço. Levantou-se, dirigiu-se ao quartinho onde se guardava todo tipo de material, e achou o que buscava. Voltando aos afazeres, continuou a relembrar de bons momentos vividos. Jorge era realmente um baita dum macho! Fizera ela gozar logo de cara, na primeira trepada! Mexeu a cabeça, sozinha, concordando que eram feitos um para o outro, ela e o marido, o Jorge. Ele com aquela corpulência toda, que tanto a atraía, aquele pênis grande, que ela adorava olhar e sentir entre as pernas. Adorava trepar com ele, mais que tudo, essa era a verdade. E o amava também, muito, mais que a tudo no mundo, outra grande verdade. Mais a vida deles não se resumia só a sexo. Eram também a personificação do casal moderno: sociáveis, cheios de vida, sempre passeando, indo a museus, parques, eventos, restaurantes, assistindo a filmes, visitando os amigos... As costas a estavam matando. Parou para gemer de dor. Perdera momentaneamente a força na mão direita, a esquerda toda lambuzada, escorregadia. As lágrimas escorriam-lhe abundantemente das maças do rosto, mas ela não estava arrependida, não! Faria tudo de novo, mais mil vezes, se fosse o caso. Nela ninguém passava a perna, não! Ela era uma rainha, e rainhas merecem tudo, todas as alegrias e gentilezas do mundo. E sendo rainha, também podia tudo, podia fazer o que lhe desse na veneta, o mundo era um lugar onde simplesmente perambulavam seus súditos... No dia-a-dia, Jorge era ótimo, lembrou. Viviam uma vida tranquila e movimentada, prazerosa e atarefada; tinha negócios e diversão, sexo e amizade; futilidades de toda ordem e trabalho social. Jorge era único. O amor da vida dela, o marido dela, o melhor amante que tivera. Não seria exagero afirmar-se que ela morreria por ele, que mataria por ele. A paixão que Márcia sentia era desse nível... Estava quase terminado. Ela sentou-se no chão e urinou nas calças de cansada que estava. Tinha de pensar na próxima etapa. Para isso, ia ter de rodar um bom tempo com o carro pela cidade afora, madrugada adentro. Não tinha medo. Do que poderia ter medo? Do que mais? Meia-horinha a mais de esforço... Pronto! Acabou! Foi ao banheiro. Olhou-se no espelho, era bonita, gostosa, os seios ainda durinhos, o bumbum empinado, redondo, não entendeu o porquê daquilo acontecer. Estava a um tantinho assim de desmaiar, a mente a um ponto de se estilhaçar. Pediu perdão a Deus, mas sem muita fé: nunca crera muito Nele. Veio um acesso de cinismo e criatividade: resolveu pedir a Ele que a ajudasse nesta empreitada, afinal de contas não fora ela a culpada, não mesmo, ela era apenas uma vítima das circunstâncias, macabras circunstâncias... Tomou um banho, limpou-se toda das manchas e nódoas, e das lascas de carne. Ficou linda e cheirosa como sempre fora. Uma dama da sociedade! Já passava da meia-noite. Era hora de finalizar o que começara. Desceu pelo elevador de serviço. Tudo certo. Com as costas doendo que nem facada, abriu a mala do carro e pôs os embrulhos lá, vários e vários deles. Na hora de fechar, não conseguiu. Claro, um pedaço da perna do Jorge. Um maldito pedaço da maldita perna do Jorge. Os restos imundos daquele animal grotesco, daquele pilantra traidor, daquele porco desleal que a traíra tantas e tantas vezes...

quinta-feira, 7 de junho de 2012

AVENTURAS DE JP - UM ANTI-HERÓI BRASILEIRO (por Tádzio Nanan)


*
Quando o encontrei, estava transtornado. Via-se isso na face afogueada, nos olhos esbugalhados, no lábio inferior que tremia um pouco até. Também, havia horas que se enchia de cachaça, repassando o infortúnio detalhe a detalhe. Nunca o vira num tal estado. Justo ele, alma de bem com a vida, pouquíssimas responsabilidades, anarquista muito bem sucedido no propósito de não ser fiel a coisa alguma senão a si mesmo, puro instinto, tão leve e errante quanto um flato ao vento. E o que sucedera? Uma mulher, claro, que é o que sucede, cedo ou tarde, para o bem ou para o mal, na vida de qualquer homem. Sempre fora mulherengo e elas viviam correndo atrás dele; bem-apessoado, tem dinheiro no banco, apesar de ser apenas medianamente inteligente e de ter um senso de humor desses que não se entende muito bem. Com o mulheril sua filosofia de vida era nunca ser fiel nem exigir delas que o fossem. Mas com a Maninha a coisa era um pouco diferente. Desde o começo ela mexera com suas entranhas de uma forma que não imaginaria em outros tempos. Algo nela o tocara profundamente e agora ele se servia dela como quem se serve de uma droga poderosa que causa dependência física, psíquica e moral. Estava verdadeiramente afeiçoado à pequena. E como eu disse, J.P nunca fora disso, muito pelo contrário, menoscabava o amor romântico em todas suas possíveis manifestações. Na sua cabecinha sensual e pueril tudo se resumia a sexo, o mundo seria basicamente a penetração de falos em vaginas. Enfim, o caso é que eles viviam num relacionamento aberto e até onde vigorasse a total ignorância do que cada um fazia nas horas de ausência um do outro, estava tudo bem, estava tudo certo. Entanto, dias atrás ele achou o diário da pequena sobre a cama e não resistiu. Como um bom malandro pouquíssimo afeito às questões morais e éticas, mergulhou fundo nas páginas do livrinho para incontinenti mergulhar fundo na melancolia do desapontamento. Descobriu lá que Maninha tinha transado simplesmente com mais de duas dezenas de picas nos últimos doze meses, doses cavalares de sexo na veia, overdose mesmo, coisa da pesada, hardcore. Aquilo o afetou sobremaneira porque ele sequer se apercebera da quantidade de vezes que ela se satisfizera fora de casa. Mas o que mais o indignava é que não obstante todo seu empenho, contumaz e cotidiano, ele só se metera em doze bocetinhas no mesmo período (um terço das quais, pagando). Era ultrajante, mesmo insuportável quando descobria uma mulher que se esbaldava na luxúria muito mais do que ele próprio conseguia; justo ele que se considerava o maior dos putanheiros da Terra Brasilis. E foi para me contar esse causo que me chamou para beber consigo naquele dia...



*



Me apaixonei perdidamente, sussurrou desfalecente. E seu marido, meu chefe, mal dera alguns passos em direção ao mictório. Tocou-me languidamente as coxas, deslizou as mãos pelas mesmas, depois as recolheu, insistiu outra vez, ficou confusa, fez cara de boba, cara de sexy, cara de choro, cara de adolescente apaixonada. Minha aflição só aumentava, enquanto assistia à insólita cena. Só queria sumir dali, o escândalo que não ia ser isso, e de quebra minha demissão, vexatória, pública, irrevogável; ela é o supra-sumo das formas femininas, mas nesse momento meu contracheque é muito mais importante; mas devo admitir: em outras tantas ocasiões, a mulher do próximo mereceu de mim a mais completa prioridade! Bom, não sei como, ela se conteve, vestiu a comuníssima máscara da satisfação e pôs-se calada. Ele estranhou o comportamento um pouco indiferente dela, fez piada com isso, culpou a menorréia, e continuou bebericando, discorrendo sobre amenidades, no que o acompanhei, louco para ir-me embora.



Mais tarde, voltando das compras, já entrando no meu apartamento, observei qualquer coisa na soleira da porta. Eram meia dúzia de cartões, com declarações de amor fartamente açucaradas, enjoativamente infantis, como todas as cartas de amor de todos os chatíssimos amantes dos mais variegados quadrantes do mundo; enfim, Juliana entregava-se de corpo e alma no ardente e pecaminoso leito da luxúria; a luxúria tem nome, o meu: JP, também conhecido entre os meus como o lobo da estepe; animal pouquíssimo dado a romantismos, insensível como os meus congêneres da Idade da Pedra Lascada, que sofre de horror à intimidade e absolutamente incapaz de se prender a uma alma que seja, nem que seja à Divina, agrilhoado à redentora idéia da infidelidade a todos as coisas, idéias e seres vivos. Meus detratores me chamam de porra-louca, desvairado, anarquista sem caráter, no que provavelmente estão certos. Mas não vamos dissecar minha personalidade nesse momento...



Você deve estar se perguntando como por mim se apaixonara tão voraz e terminantemente a mulher do meu chefinho. Bom, então é necessário que eu faça uma inconfidência: é óbvio que ela e eu transamos, e bastante! Aliás, transar é um eufemismo: fodemos mesmo, doses cavalares de sexo! Foram pelo menos dez fodas, antológicas, inesquecíveis, geralmente quando viajávamos à casa de praia do Mauro (o chefe e marido corno), para resolvermos assuntos de trabalho. Como ninguém é mais criança por aí, vou dar com a língua nos dentes: sucede que cada reuniãozinha dessas degringola amiúde em cocaína e porres homéricos; e com a censura da consciência de guarda baixa um dos meus golpes mais mortais e freqüentes é seduzir a mulher do próximo, seja quem for o infeliz, até meu chefe! Foi em tais circunstâncias que conheci os orifícios mais íntimos da Juliana. E deix´eu falar em alto e bom som: vale totalmente o risco de se levar um balaço no meio das fuças. Olhe, veja bem, não sei quem foi o idiota que inventou essa estória de mulher ter dono: mulher não tem dono, não! E isso não é nenhum arroubo feminista tardio da minha pseudo-intelectualidade mal estruturada; na minha abalizada opinião de vagabundo fundamental, ninguém é de ninguém ou, se preferir, todo mundo come todo mundo! Essa, meu irmão, é a nascitura moral sexual do século XXI. Mas deixemos a filosofice de lado e terminemos a estória: ela jurou de pés juntos e as mãos espalmadas que o cara não vinha fazendo o serviço direito havia dois anos; bom, talvez essa tenha sido a desculpa que ela arranjou para satisfazer seus instintos primevos sem culpa...



*



As primeiras aventuras sexuais de JP ainda são flashes vivos reluzindo em seus voluptuosos olhinhos (molhados de concupiscência, como gostava de dizer um antigo “affair”), tão nítidos e envolventes quanto uma projeção no escurinho do cinema (e não é um cinema particular a tela da memória onde passamos a trama acre-doce das nossas vidas?): impúbere ainda assistia as tias saracoteando, seminuas, ancas e bundas e peitos balouçando impunemente, exibindo-se umas pras outras, pra si mesmas, na frente do espelho, e também pra ele, expectador privilegiado, que quietinho ali no canto do quarto, mudo e excitado, se lançava àquele novo universo com todas as fibras do seu ser, enquanto as loucas ninfômanas lhe faziam caretas, acariciavam-se, apaixonadas por si mesmas, e morriam de delícias, enlevadas com a situação (inadequada para a moral conservadora da maioria das famílias, mas não para a sua, covil de anarquistas, adictos e porras-loucas); e se mostravam a ele costumeiramente ao trocarem as roupas íntimas ou quando saíam do banho da tarde ou ainda ao abaixarem a calcinha no bidê, revelando-lhe aquele objeto do desejo de meia humanidade.
Se com as despudoradas tias fora apresentado à anatomia feminina, suas reentrâncias, saliências, círculos e triângulos imperfeitos, com as primas mais velhas, já cheias de sinuosos relevos, e também com as tabulares e curiosas priminhas da sua idade ele pode sentir os ígneos prazeres dos primeiros toques, carícias, apalpadelas; da esfregação das partes baixas umas nas outras; dos suspirares nos cantos de parede e pelas madrugadas, em camas compartilhadas (quando montavam uns nos outros como se treinassem o ato reprodutivo); dos lascivos odores e líquidos corporais a se espraiar... Desde aí pode mostrar a qualidade do seu estro e a paixão ruidosa, ardente e incontrolável que nutriria pela fêmea da espécie humana pelo resto da sua longa, impudente e imprudente vida.
Essas lembranças vivas desassossegam o coração do jovem garanhão até hoje. Ainda que tudo tenha se passado há bastante tempo (e com tantas mulheres experimentadas ao longo da sua viril juventude) ele ainda sonha com as curvilíneas e gastronômicas priminhas, hoje a transluzir o viço e a galhardia dos vinte e poucos anos; sonha com mostrar-lhes a expertise adquirida (como mudou desde aquela pré-adolescência confusa, tímida, franzina...). Nele ficou cravado, parece-lhe que indelevelmente, um desejo incoercível, uma tensão no ar (“o ronronar das antenas invisíveis” de que fala o poeta), uma fascinação por cada uma daquelas personagens do seu lúbrico passado. Sim, sempre se lembrava delas, teso, afogueado, bem como das joviais amiguinhas que amiúde as acompanhavam, meninotas com seus 11, 12 anos, outras, mocinhas beirando os 14, 15, as primeiras fêmeas da espécie a devassar-lhe a nudez e a admirar seu órgão sexual excitado! Como era bom tomar banho com elas, naquelas tardes de férias, voltando das praias, nas casas alugadas pela família, quando a turma toda se reunia; vê-las investigando a própria nudez com espelhos, ou brincando brincadeiras adultas, quando mostravam suas intimidades uns aos outros... Era um êxtase lembrar-se dos corpos nus, debaixo do chuveiro, o seu, ficando maior, mais espesso, ano a ano, os delas mudando as formas, os volumes, dando a antever as mulheres graciosamente desenhadas pelo lápis do divino prestes a sair daquele envoltório ainda mirrado e simplório. Anos passaram-se assim! Gloriosos e saborosos anos, anos imortais! Dos 9 aos 14, ele esbaldou-se nessa orgia sem pecado, nessa libidinagem sem conseqüências....



*



JP percebeu que podia ouvir com alguma clareza os ruídos que suas amiguinhas faziam, no vestiário ao lado, antes e depois das aulas de educação física, e pôs-se a maquinar que poderia haver, quem sabe – seria bom demais para ser verdade?, um duto de ar que estivesse levando os sons de um vestiário ao outro; começou a procurar, sem chamar atenção, algum possível ponto de ligação entre os dois ambientes; e não é que na parte dos chuveiros havia um duto, estreitinho, muito ao alto, que parecia ligá-los? Ficou arquitetando planos para poder subir até lá, talvez um corpo pequeno e mirrado como o seu coubesse no duto; analisou a parede para ver se, de alguma forma, poderia subir por ela, e após alguns segundos de investigação, concluiu, decepcionado, que era impossível chegar até lá, bem como passar por aquele duto, e sabe-se lá o que teria depois dele, talvez apenas a visão do logradouro...



Mas vejam o que é a mão (ardilosa? benfazeja?) do destino: um mês depois, JP estava na aula de educação física e ficou com vontade de ir ao banheiro, pediu a permissão, foi; no momento em que entrava no vestiário, dois homens estavam saindo e disseram-lhe: “A gente está fazendo uma pequena reforma nos chuveiros, por isso está cheio de material espalhado pelo chão, mas voltamos logo, em vinte minutinhos...” JP deu de ombros, foi até a latrina, fez um longo xixi, e quando voltava à aula, o bichinho da curiosidade lhe picou, e ele voltou atrás para dar uma singela olhadinha na reforma; pois bem, estava lá, magnífica, providencial, do alto dos seus vários metros, uma escada, a escada que ele tanto sonhara um mês antes, a própria mão de Deus a havia posto lá, para que ele pudesse, enfim, ter o seu momento de iluminação, a sua visão do paraíso; incontinenti, arrastou-a cuidadosamente para o lugar onde identificara o suposto duto de ar, e subiu cheio de ansiedade; o duto era estreito e devia ter uns três metros de comprimento, mas ouvia-se claramente os ruídos que as meninas do terceiro ano faziam, voltando da aula de educação física; naquela classe, muitas garotas eram amigas de sua irmã, e algumas eram paqueras que frequentavam a sua casa, além da L., o amor de sua juventude; isso o motivou deveras; sim, faria isso: meteu-se sem muito pensar no duto – só coube ali por causa dos seus 14 anos e seus poucos quilos, e foi arrastando-se devagar e silenciosamente, tinha 15 minutos até a dupla de estraga prazeres voltar; é, ele tinha razão, o duto ligava os dois ambientes: começava a ver parte do outro vestiário; logo depois, já com a cabeça quase no limite do duto, viu as garotas nuas, tomando banho, e viu a sua L., que parecia despir-se sensualmente para ele, peça após peça da indumentária, o sutiã, o jeans, a calcinha... ele quase perdeu os sentidos! JP ficou ali por uns quinze minutos, até a última garota deixar o recinto. Quando tentou voltar, percebeu que não tinha como manobrar seu corpo, não tinha mais aquela adrenalina, os braços estavam praticamente presos, e ele não poderia voltar; inicialmente, entrou em pânico, mas controlou-se, sabia que os caras voltariam logo; esperou-os e eles chegaram um pouco depois; gritou por socorro, bateu as pernas, os caras o viram e o retiraram de lá, às gargalhadas, claro; já no chão, sem ter o que dizer, pediu pelo amor de Deus para que não contassem nada; os dois sujeitos fecharam a cara para fazer-lhe medo, como se dissessem que o denunciariam, mas no fim conseguiram o que queriam, dinheiro: cem pratas na mão de cada um; e o assunto, pelo menos para o grande público findou-se por aí; mas na cabecinha sensual de JP aquelas imagens – verdadeiras delícias do paraíso perdido, levam-no a vertiginosos momentos de delírio ainda hoje...



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JP passou horas aprumando o espírito com meditação, malhando os músculos com halteres emprestados à um amigo, customizando a indumentária, engalanando-se para atrair as fêmeas mais susceptíveis e desinformadas sobre seu caráter, enfim, fazendo tudo o que lhe era possível para obter uma ótima performance na festança de logo mais. Tinha a expectativa de copular bastante, e com muitas mulheres (esta era a sua expectativa usual, dado os ótimos resultados de suas séries históricas a respeito do assunto); e quem sabe não fosse seu dia de sorte, indo parar na cama com duas ao mesmo tempo, talvez as gêmeas I. e B., em que punha os olhos esfomeados há tempos, desde a nem tão inocente assim época de colégio...



Acoplou-se ao BMW de quinhentos mil reais, e pisou fundo. À caminho do regozijo, parou num quase arrabalde para comprar baseado, pó, ecstasy, tudo que fosse ilícito e possível de ser comprado e iniciou a viagem ali mesmo, como que calibrando a máquina; transou no banco de trás com suas putinhas preferenciais, enrijecido com os comprimidos azuis (estava sempre preparado para ocasiões especiais); e teve que subornar o merdinha de um guarda de trânsito que teve a ousadia de pará-lo numa blitz: molhou-lhe a mão com 300 pratas e foi-se embora, cantando pneu e mostrando o dedo para a patuleia...



Quando se apresentou na milionária cobertura do Flávio, o anfitrião da festa (o dono da festa era o JP, como de costume), o nosso (anti-)herói já havia fumado dois baseados, cheirado cocaína, ingerido viagra, e bebido whisky. Para a sorte dele o putanheiro tem um coração de aço. É porque, além dos bons genes, o tema saúde não era de todo negligenciado. Quando não sucumbia à perdição, até que acordava cedo, alimentava-se bem, fazia exercícios com certa regularidade. Mas ele sempre quisera conhecer os dois lados de tudo, as duas faces da moeda, estava gravado no ADN dele a busca, e assim mergulhava tanto no calor do dia, quanto nos insondáveis mistérios da noite, profunda, perigosa, e muitas vezes inadvertidamente...



Durante a festa, discutiu seus investimentos milionários no mercado financeiro: derivativos, títulos públicos, letras hipotecárias, etc; palestrou sobre economia internacional com dois especialistas no tema, bebeu, fumou, cheirou, trepou até a exaustão (cansadas das suas costumárias investidas, I. e B. finalmente anuiram com a indecorosa proposta...)



Mas um certo alguém o observara por todas as longas horas da greco-romana festança. Era o irmão do anfitrião, Leonardo, médico bem-sucedido, rico, boa-pinta, e decidida bichona. Éh, Leonardo sempre tivera uma queda por JP, que era tudo quanto um gay não quer para um enlace matrimonial, mas tudo quanto sonha para uma foda estrondosa. E com a cara e a coragem foi abordar seu cotidiano objeto do desejo. Já tinha pensado numa estratégia e estava disposto a pagar qualquer preço para fazê-la operar eficazmente. No começo o papo rolou fácil, sobre diversos temas (como sempre, JP muito simpático e loquaz). As pessoas passavam por eles só para se despedirem, já que passava das quatro e a festa ia minguando. E antes que nosso (anti-)herói também anunciasse sua partida, Leonardo dera seu xeque-mate: ele, que não era chegado à branquinha, convidou JP para ir à seu quarto aspirar a última carreirinha da madrugada; inocentemente JP aceitou; ambos cheiraram a maldita e incontinenti perderam o juízo, mas por motivos diferentes: Leonardo por paixão, JP por quase overdose...



Nosso (anti-)herói acordou às três da tarde, tropeçando nas pernas, a cabeça tilintando como campainha. Estava só. Apenas um recado do Flávio, dizendo que ele comesse alguma coisa e desse as chaves ao porteiro quando se fosse. Desceu o prédio tentando recordar o que acontecera nas últimas horas, mas não conseguiu...

(...)

O que terá acontecido a JP naquele quarto, naquelas possivelmente ultrajantes horas? Desde então, ele nunca conseguiu juntar a necessária coragem para perguntar a Leonardo qualquer coisa sobre o potencialmente vergonhoso incidente, apesar de haverem alguns sórdidos indícios de que algo anti-natural acontecera àquela madrugada, como, por exemplo, o fato de o Leonardo dar-se ares de grande intimidade consigo, além de algumas lembranças confusas, de corar a face. Será mesmo que JP, devorador de mulheres, estivera, enfim, com um homem na cama?!

UM CONTO DA MEIA-NOITE - por Tádzio Nanan


Quando adentrou a sala de casa, muito bem vestido, o grupo já o aguardava com certa ansiedade. Era o último guerreiro a juntar-se a ele. Cumprimentaram-se fraternalmente, até docemente, eu diria. Quem os visse ali, a deixar-se levar pela primeira impressão, logo demonstraria simpatia pelos rapazes, tal a admiração produzida por seus modos suaves, suas compleições saudáveis, a esmerada educação recebida, traduzida numa certa sofisticação ao falar. Cientes disso, se empavonavam, enchiam-se de uma discreta mas perceptível arrogância.
Despediram-se dos progenitores do mais velho do grupo, gente de ótima estirpe, enorme influência na sociedade, e partiram fazendo troça uns com os outros, gargalhando alto, como se nada houvera no mundo que eles próprios. A boate Liberdade era o destino do grupo, a qual se dirigiam em dois BMWs de centenas de milheres de reais. O Liberdade era uma das boates mais elegantes da cidade, frequentada pela endinheirada burguesia nacional e internacional. Além do divertimento, visavam a traçar estratagemas para a operação daquela madrugada, que esperavam tão excitante quanto às passadas.
Não exageraram no álcool face à necessidade de agir com certa prudência. Mas um deles disse: Dane-se a prudência, o dinheiro resolve qualquer imprevisto! Este exagerou na bebida, e os outros acabaram dando de ombros – em se tratando de Brasil, ele estava certíssimo!
Lá pelas duas da manhã relembravam animadamente de suas recentes secretas aventuras, e moderaram um pouco o tom de voz. O jogo de luz e sombras, os vapores dos charutos asfixiando o ambiente, o caráter das personagens, lembrou-me a mim, narrador onisciente, um filme noir americano dos anos 40 ou 50, este certamente impróprio para menores...
Até que finalmente deixaram o copo, e se dirigiram à administração da boate. Apertaram um por um a mão de um antigo segurança, acenaram com a cabeça ao gerente do estabelecimento e penetraram sem cerimônia uma sala contígua à administração. O mais novo deles, rapagão de 1,90, cientista da computação, já completamente íntimo do ambiente, afastou um pesado móvel que escondia um alçapão. Abriu-o e dele foi retirando um a um seu conteúdo e distribuindo com seus bons camaradas. Todos se serviram à vontade, pareciam satisfeitos, ninguém invejou ninguém.
O dono da boate apareceu para falar-lhes, desejar-lhes boa sorte. Era um empresário respeitadíssimo na cidade, conhecido até nacionalmente por sua generosa fortuna pessoal. Depois de cumprimentá-los, ele ficou lá, parado, com ar solene, assistindo ao resto do evento em silêncio.
Os cinco rapazes faziam seus últimos preparativos, checavam seus brinquedos, arrumavam suas roupas, os cabelos. Havia naquele proceder mecânico, silencioso, devotado, qualquer coisas semelhante à uma liturgia religiosa.
Com a voz um pouco embargada, o mais bem-nascido deles, herdeiro de centenas de milhões de reais, exaltava as qualidades de cada um dos presentes e incitava o grupo a grandes feitos em tempos de frouxidão dos valores morais e tibieza da honra. Havia sem dúvida um toque épico em seu eloquente e requintado discurso.
Lá fora a chuva rala, deixando a cidade mais sombria e deserta, parecia querer promover-lhes os propósitos.
Cristiano interrogou calmamente:
- O que vai ser hoje?
Henrique, respeitado professor universitário, foi direto:
- Travestis! Mataremos travestis!

PENSAMENTOS DO DIA - por Tádzio Nanan


O mundo está cheio de lugares lindos; nenhum deles é mais lindo que o olhar da mulher amada!

Ser o senhor de incomensuráveis vastidões de terras; ser o senhor de reinos miraculosos; ser o senhor de tesouros incalculáveis; ser o senhor de exércitos incontrastáveis...
De todas estas coisas o homem abriria mão em prol de ser o senhor de apenas uma coisa: o desejo feminino!

*

Ao contrário do que afirmam as pessoas de fé, que baseiam a ética no temor a Deus, é bem mais fácil acabar-se com o mundo devido a “presença” Dele nos assuntos humanos, que devido a Sua “ausência”!

quarta-feira, 6 de junho de 2012

PENSAMENTOS DO DIA - por Tádzio Nanan

Facebook: the "place" where everybody you dislike, you do not know and you do not trust can become your best childhood friends!
This is the best medicine ever invented for self-esteem!
You now understand the billions of Zuckerberg?

Facebook: o "lugar" onde todo mundo que você não gosta, que você não conhece e que você não confia pode tornar-se seus melhores amigos de infância!
Este é o melhor remédio já inventado para a auto-estima!
Você compreende agora os bilhões de Zuckerberg?

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The Luddite movement revisited and updated:
* Make the world a favor: destroy your car;
* Do yourself a favor: destroy your television;
* Do yourself a favor: destroy your cell phone;
* Do yourself a favor, delete your Facebook account;
* Make the world a favor: burn your "sacred" book!

O movimento ludita revisitado e atualizado:
* Faça um favor ao mundo: destrua seu carro;
* Faça um favor a você mesmo: destrua seu aparelho de televisão;
* Faça um favor a você mesmo: destrua seu telefone celular;
* Faça um favor a você mesmo: apague sua conta do Facebook;
* Faça um favor ao mundo: queime seu livro "sagrado"!