O
senhor K morreu e levou consigo seu enigma.
Quem
foi ele, ninguém nunca conseguiu responder.
Ele
próprio não dissera ou escrevera palavra sobre si.
Algumas
pessoas morrem e permanecem indecifradas. Para os outros, para si
mesmas. Até para Deus, eu acho!
Outras,
entregam-se tanto à vida, que se sabe delas num relance.
Algumas
pessoas são esfíngicas. Esfinges de si mesmas, a lançar charadas
mortais, ao invés de aproveitar o tempo (o tempo ele mesmo uma
charada mortal, mas não vamos discursar sobre isso agora...).
Algumas
pessoas são um quebra-cabeça que nunca se monta. Vivem uma vida
inteira aos pedaços, abandonadas sobre a mesa das horas, esquecidas
em cantinhos obscuros do casarão da existência, vivendo tristemente
longas vidas impensadas, dessentidas. Nunca lançando luz sobre seu
íntimo mistério (o Mistério de todos nós, esqueçamo-lo
momentaneamente...)
O
senhor K morreu. Juro por Deus que para mim ele morrera anos antes,
de um certo mal misterioso.
Mas
o que disseram é que ele mumificara em vida, e assim perdera seus
derradeiros mas ainda joviais anos!
Sucede
o mesmo com quantos, que são esquecidos por Deus, pelas gentes, e até pela
burocracia estatal!
Quantos
de nós, que aqui reunidos, bebericando, tagarelando, parecemos estar
vivos, mas estamos mesmo – viver é isso, é só isso?
Pois
é, quantas pessoas morrendo vivinhas da silva. Ninguém sabe delas.
Elas próprias esquecem de si durante toda uma vida, afogando-se em
covardias, melindres e pequeníssimos dramas. Uma vida de cotidianas
mortes. Vidas impensadas, dessentidas; vidas dispensadas,
ressentidas...
É
mesmo de querer morrer, viver assim. E morre-se mesmo de morte morrida se assim vivemos!
O
senhor K morreu. Cedo ainda. Aos 53.
Mas
alguém sussurrou no enterro que já fora tarde!
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